A Prudência à luz do conceito de Aristóteles!
O vocábulo prudência vem do latim prudentia, o qual vem de providere, que pode significar prever e prover. É uma qualidade que permite detectar os perigos e evitar os erros.
Os gregos usavam a palavra phronésis para a designar. Aristóteles considerava que se tratava de uma virtude intelectual, na medida em que tem que ver com a verdade, com o conhecimento e a razão.
Para o estagirita, a prudência é a virtude que permite deliberar correctamente acerca do que é bom para a pessoa e agir de acordo com isso. Não cabe à prudência a eleição das finalidades, mas apenas a escolha dos meios adequados para atingir as finalidades. É a virtude da boa deliberação. Enquanto a virtude moral assegura a retidão do fim que perseguimos, a prudência trata dos meios para alcançar esse fim.
A prudência não reina, mas governa e, nessa medida, é imprescindível à boa deliberação, à boa decisão e à boa ação. A prudência é uma espécie de disposição que permite escolher e realizar os actos cuja realização depende de nós. Aristóteles distingue a prudência de outras virtudes do pensamento, visto ser entendida como a virtude da boa deliberação, Aristóteles nega que a prudência e a sabedoria sejam uma e a mesma coisa. A sabedoria tem por objecto aquilo que existe por demonstração e que é sempre da mesma maneira. A prudência refere-se às coisas úteis, as quais não têm a propriedade de serem imutáveis. Uma coisa útil hoje pode tornar-se inútil amanhã. Ora, a prudência permite determinar a utilidade das coisas, tendo em consideração as circunstâncias particulares e o momento. Embora se possa dizer que uma pessoa prudente é hábil a prudência não é uma habilidade. Posto que nem todos os homens hábeis são prudentes, pois são conhecidos muitos homens vis que também são hábeis na maldade.
A prudência é um saber-fazer. Pressupõe estar atento, circunspecção e cautela. É a virtude da paciência e da antecipação. Determina o que devemos escolher e o que devemos evitar. Não pode, contudo, confundir-se com receio e, muito menos, com cobardia. Os franceses utilizam a palavra sagesse para a designar, mostrando bem que a boa deliberação anda sempre associada à inteligência. Santo Agostinho dizia que a prudência é um amor que escolhe com sagacidade.
Como a boa deliberação exige o uso da razão, parece não haver dúvidas que pertence ao pensamento. Mas não pode ser qualquer tipo de pensamento. Uma vez que a boa deliberação é a deliberação correcta, importa saber o que é uma deliberação correcta. Para Aristóteles (3), " a boa deliberação é correção que reflecte o que é benéfico, sobre a coisa certa, de forma correcta e no tempo certo". A boa deliberação só é incondicionalmente boa se promover uma recta finalidade.
Haverá uma relação entre prudência e inteligência? Aristóteles pensa que sim: "se ter deliberado bem é próprio de uma pessoa inteligente, a boa deliberação será o tipo de correcção que expressa o que é expediente para a promoção do fim acerca do qual a inteligência é uma suposição verdadeira."
Aristóteles afirma que a boa deliberação não é apenas a descoberta dos meios mais eficazes para a promoção dos fins. A boa deliberação visa alcançar o bem. Não é possível uma boa deliberação que vise um fim vil. O bom deliberador e a pessoa inteligente e virtuosa devem alcançar a conclusão correcta, utilizando o método adequado. A inteligência é uma virtude do pensamento que significa a boa deliberação sobre as coisas que contribuem para a nossa felicidade e que resulta numa correcta decisão sobre os fins rectos.
Aristóteles, na Magna Moralia, afirma que é a prudência "que vigia todas as faculdades e é a governanta porque é ela que dá as ordens. Talvez ela seja como o intendente numa casa. De facto, é o intendente que organiza tudo, mas ele não governa tudo. A sua tarefa é a de fornecer tempo livre ao senhor da casa, a fim de que este não seja impedido pelas tarefas necessárias e não se veja impedido de aceder a alguma das nobres tarefas que lhe convêm. É, da mesma forma, que a prudência é uma espécie de intendente para a sabedoria, fornecendo-lhe tempo livre para completar a sua obra, ao controlar as paixões" (5).
No capítulo III do livro II da Magna Moralia, o estagirita considera que a deliberação correcta diz respeito ao mesmo domínio da prudência, porque ambas tratam de escolher as ações que devemos eleger ou evitar. Por isso, está correto dizer que a prudência não reina, visto não ter a função de escolher os fins, mas governa, porque lhe cabe escolher os meios adequados para os fins rectos.
Na Magna Moralia, Aristóteles afirma que o homem injusto não possui as características do homem prudente. É típico do injusto a incapacidade para discernir bem, para avaliar a diferença entre o bem e o mal e para controlar as paixões e apetites. No homem prudente, a parte sensitiva da alma está em paz com a parte racional. No homem imprudente, a parte racional da alma deixa-se dominar pela parte sensitiva.
Prudência é portanto, a ação ponderada, discutida, examinada, enfim, deliberada. Sim, o Estagirita desenvolveu o conceito de phronêsis legado por Platão e concebeu uma importantíssima teoria geral da ação, uma hermenêutica da existência humana enquanto agente no mundo e sobre o mundo. A phronêsis/Prudência – recta ratio agibilium – é virtude opinativa da alma: “daí que a Prudentia seja considerada a mãe (genitrix virtutum) e a guia (auriga virtutum) das virtudes” diz. Logo a prudência é a virtude que permeia as demais, é Intelactual mais também é moral!